DHAA

Exigibilidade do DHAA

O Direito Humano à Alimentação está consagrado em múltiplos instrumentos jurídicos internacionais dos quais o Brasil é signatário. Nesse sentido, já em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humano reconhecia, em seu artigo 25º, o direito de todos a “um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis”. Tal direito foi posteriormente reafirmado no Artigo 11° do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), promulgado em 1966 e ratificado pelo Brasil em 1992, que reconhece o direito de todos estarem “livres da fome”. 

Esse tema foi aprofundado no Comentário Geral Número 12 do Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, em 1999, agora incorporando a dimensão de que o Direito Humano à Alimentação deveria estar vinculado a uma alimentação adequada e reconhecendo que tal direito se realiza quando toda pessoa “tem acesso físico e econômico, em todo momento, à alimentação adequada ou aos meios para sua obtenção. O direito humano à alimentação adequada (DHAA) não deve, portanto, ser interpretado em sentido estrito ou restritivo que o equipare a um pacote mínimo de calorias, proteínas e outros nutrientes específicos”. Essa noção é seguida pela de sustentabilidade, de modo que os alimentos sejam acessíveis às gerações presentes e futuras, e de adequado, que está ligada às “condições sociais, econômicas, culturais, climáticas, ecológicas e outras prevalecentes”. Assim, uma alimentação adequada deve satisfazer “as necessidades dietéticas dos indivíduos, ser isenta de substâncias nocivas e aceitável dentro de uma determinada cultura”.

No Brasil, o direito à alimentação foi incorporado à Constituição Federal em 2010, a qual passou a afirmar em seu artigo 6º que “são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”. Ademais, o DHAA é princípio guia das políticas de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). A Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN) reconhece que SAN “consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”.

Ainda que tais instrumentos reconheçam a alimentação adequada como direito a ser garantido pelo Estado e façam recomendações em termos de políticas públicas para assegurar tal direito, a alimentação não é direito para milhões de pessoas que atualmente se encontram em situação de fome ou de insegurança alimentar. Para além disso, faltam instrumentos de exigibilidade política e judicial da alimentação adequada como um direito que deve ser assegurado pelo Estado.

Ao longo dos seus 25 anos, o FBSSAN vem historicamente contribuindo com a luta pelo Direito Humano à Alimentação. Destaca-se a participação ativa do Fórum na campanha “Alimentação, Direito de Todos”, coordenada pelo CONSEA, pela aprovação da Emenda Constitucional nº 64 em 2010 que incluiu o Direito à Alimentação no artigo 6º da Constituição Federal. 

O Fórum também contribuiu com a constituição da Comissão Especial de Monitoramento de Violações ao DHAA no âmbito do Conselho Nacional de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH). A Comissão exerce um papel estratégico no monitoramento de violações ao DHAA e na definição de mecanismos de reparação dessas violações.

Mais recentemente, no contexto da pandemia de Covid-19, o FBSSAN participou da elaboração do documento “Garantir o direito à alimentação e combater a fome em tempos de coronavírus: a vida e a dignidade humana em primeiro lugar!”, assinada por mais de 150 organizações e movimentos, que propunha um conjunto de 11 ações a serem adotadas pelo Estado para a garantia do DHAA durante a crise sanitária.

Ainda em 2020, em parceria com o CSDHANA-NE, a FIAN Brasil e Instituições de Ensino Superior (UFRJ, UFPE, UERJ, UFRJ), o Fórum realizou o curso “EXIGIBILIDADE DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO E NUTRIÇÃO ADEQUADAS JUNTO AO PNAE”, contando com a participação de cerca de 150 conselheiros/as municipais/estaduais de Conseas, Conselhos de Alimentação Escolar e ativistas de todas os estados brasileiros. O curso teve como objetivo oferecer instrumentos para a formação de dinamizadores de processos locais voltados para a exigibilidade do DHANA relacionados ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) no contexto da pandemia da COVID 19. Os principais conteúdos do curso estão reunidos no livro eletrônico “Programa Nacional de Alimentação Escolar: diretrizes e exigibilidade em tempos de pandemia”.

Frente às violações ao direito à alimentação escolar na pandemia, o FBSSAN, em parceria com a PLataforma DHESCA Brasil e a FIAN Brasil realizou uma audiência popular com o relator da ONU Michael Fakhri

Em 2020, o FBSSAN criou um grupo de trabalho com a participação de redes e articulações parceiras e membros de Defensorias Públicas e Ministérios Públicos para fomentar processos formativos em exigibilidade do DHAA e mobilizar o sistema de justiça brasileiro sobre o tema. Essa ação resultou na elaboração da carta aberta “A violação ao direito humano à alimentação adequada vestiu a toga. Não aceitaremos fome e injustiça no prato dos estudantes”. Também foi realizada uma reunião com o ministro Luiz Fux, em que foram apresentadas demandas em relação às ADPFs protocoladas. 

No âmbito internacional,  destaca-se a participação do FBSSAN na Rede Regional de Segurança Alimentar e Nutricional da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – REDSAN-CPLP. A Rede é formada por redes nacionais de 8 países: Brasil, Guiné Bissau, Angola, Moçambique, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe,Timor Leste e Portugal. A Redsan-CPLP se configura em um espaço de troca de experiências da sociedade civil e de construção de estratégias conjuntas para influenciar na agenda política desde a perspectiva do Direito Humano à Alimentação.