O surgimento do FBSSAN é antecedido por um período em que o neoliberalismo ganhou força, priorizando leis de mercado em detrimento dos direitos de trabalhadoras e trabalhadores. Nessa época, a sociedade se mobilizou e criou, mais especificamente em 1993, a Ação da Cidadania Contra a Fome e a Miséria e Pela Vida, que exerceu um papel relevante no diálogo com o então presidente Itamar Franco para a criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). É por meio deste órgão federal que a 1ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar (SAN) é convocada. No relatório final do evento já constava a preocupação com a concentração de renda e de terra como determinantes da insegurança alimentar. Realizado em 1994, foi um marco para a construção da agenda de SAN no Brasil.
Esse processo, no entanto, foi interrompido pelo governo Fernando Henrique Cardoso, que extinguiu o Consea. As organizações e movimentos sociais voltam a ganhar algum fôlego em 1996, com a preparação de uma conferência alternativa e paralela à Cúpula Mundial da Alimentação, promovida na Itália pela ONU. A delegação brasileira obteve expressiva participação, e diversas entidades, que se articularam a partir dali, realizaram mais tarde um encontro nacional em São Paulo. É nele que ocorre o lançamento do FBSSAN, em 1998. Desde então, o país passa a ter um espaço permanente de debate e proposição de ações em prol da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN).
No início dos anos 2000, o Fórum contribuiu na elaboração do Projeto Fome Zero pelo Instituto Cidadania. Em 2003, com a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a questão ganha destaque e o Consea é refundado. No ano seguinte, é realizada a 2ª Conferência Nacional de SAN, quando foram lançadas as bases da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN).
Os anos subsequentes são marcados por uma intensa participação do FBSSAN no Consea, um trabalho fundamental na formulação de políticas públicas como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional da Alimentação Escolar (Pnae).
A atuação do Fórum também foi relevante na construção da Lei Orgânica de SAN (Lei 11.346/2006). O FBSSAN contribuiu, ainda, na preparação da 3ª Conferência Nacional de SAN, que ocorreu em 2007. O evento relacionou a alimentação ao debate de desenvolvimento, perspectiva que se mostrou central diante da crise econômica que, em 2008, estourou no mundo. O número de pessoas que passa fome no planeta encostou na marca de um bilhão. De forma oportunista, a velha ideia de aumentar a produção para sanar o problema ganhou peso político, mais uma brecha para os negócios de transnacionais de agrotóxicos e transgênicos. O FBSSAN, entre outras organizações e movimentos sociais, reforçou a posição de que fome não é gerada pela falta de alimentos, mas por sua desigual distribuição.
Aqui no Brasil, a sociedade civil organizada volta energia para o fortalecimento de mercados institucionais. Em 2009, a partir da atuação no Consea e junto à Frente Parlamentar de SAN, o Fórum se articula com o campo agroecológico, da saúde, nutrição e economia solidária, dentre outros, para pressionar na elaboração, aprovação e implementação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). O texto determina a utilização de, no mínimo, 30% dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para alimentação escolar, na compra de produtos da agricultura familiar e de empreendedores familiares rurais, priorizando os assentamentos de Reforma Agrária, as comunidades indígenas e quilombolas.
Em 2010, é aprovada a Emenda Constitucional 64, que inclui a alimentação dentre os direitos fundamentais garantidos no Artigo 6º da Constituição Federal. Esta vitória reflete um amplo processo de mobilização na luta pela associação do Direito Humano à Alimentação aos direitos econômicos, sociais e culturais. Também neste ano, o FBSSAN contribuiu para criação da Frente pela Regulação da Publicidade de Alimentos. Essa tem gerado bons resultados, como a publicação da Resolução nº 24 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), ítem que trata da regulação da propaganda de alimentos que fazem mal à saúde.
Em 2011, o Fórum atuou na organização de Conferências Estaduais preparatórias à 4ª Conferência Nacional de SAN, onde ocupou espaços estratégicos como as comissões de conteúdo e metodologia. A carta política do evento nacional lembra o processo de formulação do 1º Plano Nacional de SAN. Construído em consulta com o Consea, o Plano, que trata de ações de 2012 a 2015, só foi possível por meio da ação coordenada pela Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisan). A 4ª Conferência destacou, ainda, a consolidação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) como estrutura responsável pela formulação, implementação e gestão participativa da política de SAN. No entanto, afirmou que o país permanece com as contradições e desafios decorrentes de um histórico de exploração e desigualdade social. Apontou que estão suficientemente demonstrados os danos causados pelo modelo agrícola concentrador de terra e com foco na monocultura, o agronegócio. Essa agricultura, que tem em sua base o uso de agrotóxicos, segue com muita força no país, sendo que o Brasil é o maior consumidor de venenos no mundo.
Enquanto isso, com apenas um quarto da terra agricultável no país, é a agricultura familiar que responde por 70% dos alimentos que chegam na mesa da população, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Ainda assim, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) insiste em atender os interesses dos que querem artificializar os alimentos, já tendo liberado, inclusive, a transgenia na tradicional combinação: arroz e feijão.
Além disso, pouquíssimos territórios indígenas e quilombolas, entre outros povos tradicionais, possuem titulação. Como obstáculo, está a bancada ruralista. Em 2012, os representantes latifundiários pressionaram, por exemplo, para a aprovação do novo Código Florestal. Após protestos da sociedade, o texto final sofreu vetos da presidenta Dilma Rousseff. Porém, organizações e movimentos sociais denunciaram que esses foram insuficientes. Os ruralistas permaneceram beneficiados, já que legislações ambientais seguiram fragilizadas em prol da mercantilização da natureza.
No mesmo ano, a sociedade civil lutou e conquistou uma Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica. O texto pode possibilitar ações políticas relacionadas às sementes, essenciais na disputa por uma outra agricultura. No entanto, questões fundamentais à SAN foram retiradas da proposta, como a referência do princípio constitucional da função social da terra e a importância do controle social da água. Não é coincidência que a Reforma Agrária no país está paralisada. Segundo dados do Incra, existem cerca de 180 mil famílias no Brasil em busca de um pedaço de terra para plantar.
A partir de 2016, em um contexto de declínio da democracia, o FBSSAN tem se posicionado contra os retrocessos, protagonizando e/ou engajando-se em iniciativas como: i) a publicação bianual, em parceria com a FIAN, de relatórios de monitoramento de retrocessos e violações do DHANA; ii) a secretaria executiva da “Conferência Nacional, Popular, Autônoma: por Direitos, Democracia, Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional”; iii) a secretaria executiva do Observatório da Alimentação Escolar.
Até 2011, o FBSSAN teve a sua secretaria executiva sediada no Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), sendo transferida em 2012 para a FASE. A secretaria executiva tratava-se de uma estrutura rotativa e interinstitucional, passando por organizações que fazem a gestão dos projetos e recursos, a exemplo do Polis, IBASE, FASE, CEDAC e tendo contado com suporte de realização de atividades pelo CERESAN uma vez que o FBSSAN não é Pessoa Jurídica, dada a sua lógica de funcionamento e organização.
Durante o VIII Encontro, realizado em 2018, entendeu-se que o FBSSAN não contava mais com condições financeiras para assegurar uma secretaria executiva que desse conta das dinâmicas de uma coordenação ampliada e de representações regionais. Propôs-se uma estrutura provisória, mais simples e flexível, para garantir uma dinâmica de funcionamento capaz de operar as estratégias e atividades programadas durante o encontro, o que se consolidou na forma de um Núcleo Executivo, sediado no Rio de Janeiro, com reuniões periódicas à distância com a coordenação, além de atividades em vários espaços articulados com organizações parceiras. Ainda que não tenha sede física, atualmente os documentos do FBSSAN se encontram no CERESAN, no Rio de Janeiro. Formou-se também um grupo de mobilizadores do FBSSAN, que atua em rede, de forma a assegurar maior capilaridade de ação em um cenário de fechamento de espaços institucionais e desmonte de políticas. Em vários estados existem fóruns estaduais de SSAN, que se constituem como instâncias autônomas em relação ao FBSSAN, mas em permanente diálogo com o fórum nacional. Este novo arranjo pretendia ainda aprofundar a perspectiva de organização em rede com vistas à ampliação de espaços de participação e do sentido de pertencimento, além de maior compartilhamento de poder de decisão.
Com a pandemia de Covid-19, e o isolamento social que dela decorreu, essa estrutura organizativa provisória ainda não se renovou. Desde então o Núcleo Executivo do FBSSAN tem se dedicado de forma mais sistemática a três projetos: i) Conferência Popular, ii) Observatório da Alimentação Escolar, iii) Campanha Comida é Patrimônio. Tornaram-se ativos nos últimos anos dois Núcleos de Mobilização: i) Núcleo de Mobilização PNAE, que tem atuado de forma articulada ao ÓAÊ, ii) Núcleo de Mobilização Jurídico, formado principalmente por advogados e defensores do DHANA, engajados principalmente em processos de exigibilidade judicial relacionados às duas ADPFs (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) da Fome que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF).
Conheça as entidades participantes do FBSSAN.