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Roda de Conversa na Assembleia Legislativa do RS: “Com tradição tem mais sabor!”

artesanal

Nesta terça-feira (4), o FBSSAN realiza atividade na Assembleia Legislativa do RS sobre alimentos e patrimônio cultural. Em entrevista, a nutricionista Regina Miranda relaciona os temas às imposições sanitárias.

Por Gilka Resende, para o FBSSAN.

artesanalA produção artesanal de alimentos será tema de debate nesta terça-feira (4) na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, às 18h30. A Roda de Conversa “Patrimônio Alimentar e Resistência Cultural: dimensões estratégicas de luta pela comida” faz parte do 7º Encontro Nacional do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN), que acontece em Porto Alegre atéo dia 6 de junho.

A atividade visa promover diálogos junto ao poder público e à população gaúcha. O evento será moderado por Renata Menasche, da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), e contará com a representação da Frente Parlamentar de Segurança Alimentar (SAN).

O filme “O Mineiro e o Queijo”, de Helvécio Ratton, será exibido. O documentário apresenta a tradição de quase 300 anos do verdadeiro queijo minas. Feito a partir do leite cru, esse produto artesanal é um patrimônio ameaçado por leis anacrônicas e pelo lobby dos grandes laticínios. Na ocasião, a historiadora Beatriz Freire, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), fará comentários sobre os temas abordados na produção.

Assim como os produtores de Minas Gerais, os de queijo serrano, característico do Campos de Cima da Serra do Rio Grande do Sul e da Serra Catarinense, enfrentam problemas com fiscalizações sanitárias. Para a nutricionista Regina Miranda, do Fórum de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável (Fesans/RS), interesses de mercado pesam na hora de impor normas generalizantes aos produtos artesanais. Confira a entrevista:

Regina, quais são os argumentos para a não liberação de certos alimentos produzidos de forma artesanal?

São até muito importantes. Falam em inocuidade, em qualidade e higiene dos alimentos. Sou nutricionista e higienista, e acho que esses pontos não se negociam. Agora, se por acaso alguns grupos de agricultura familiar, que produzem alimentos de forma artesanal, tiverem problemas com isso, esses devem receber assistência e não terem seus produtos simplesmente proibidos. É aí que começam as diferenças entre os que impõem normas sanitárias e a gente, que luta por Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). Na minha opinião, não tem que ser como historicamente a polícia sanitária faz, que chega e diz: “olha, seu produto não é adequado e vamos fechar seu empreendimento”. O que o Estado está fazendo? Está botando esta pessoa na rua, além de colocar em risco toda uma estratégia de vida, toda uma ancestralidade naquilo que é aquele alimento.

regina miranda emater rsPoderia dar exemplo dessa memória alimentar que se perde?

Aqui, no Rio Grande do Sul, descendentes de alemães e italianos guardaram um patrimônio que é a produção de queijo, um que não é pasteurizado. E a Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] não autoriza o comércio desse produto por supostamente não seguir as normas sanitárias. Esse é um problema recorrente na agricultura familiar e na produção artesanal de alimentos. Também passam por esse entrave produtores de salame, geleias e muitos outros. Com isso, não conseguem ter acesso a políticas públicas como o PAA [Programa de Aquisição de Alimentos] ou o Pnae [Programa Nacional de Alimentação Escolar]. Isso é até uma ironia! São trabalhadores que suam muito para produzir esses alimentos e, mesmo assim, vivem na ilegalidade. E olha que existem consumidores interessadíssimos nestes produtos.

Se trata de um conjunto único de regras sanitárias que não faria sentido para muitos alimentos?  

Temos esse lado que não está sendo observado, e eu falo com tranquilidade sobre isso: os padrões higiênicos convencionados pelo Código Sanitário no Brasil são baseados em padrões de exportação. Muito do que está ali não é necessário para um comércio de circuito curto. Ora, se eu vou fabricar um queijo que vai atravessar um oceano, ele tem que ter um tipo de embalagem, tem que ter uma tal adequação. Agora, se eu vou produzir, e logo já vou vender o meu queijo na feira, a manipulação, a tecnologia, os equipamentos e a maneira de se fazer são outras.

Podemos dizer que essa realidade favorece um modo de produção de alimentos mais artificializado?

Sim, é claro. Nas propagandas das indústrias, como eu já disse, se fala em Saúde. Mas, recentemente, houve o leite batizado aqui no Rio Grande do Sul. Formol é saudável? Isso interfere sim na Saúde: não faz bem! Prefiro muito mais um queijinho que não é pasteurizado e que passa longe dessa lógica. Na minha opinião, muitas vezes, a fiscalização serve mais como uma reserva de mercado para grandes empreendimentos da indústria de alimentos. O Código Sanitário me parece um código de verdade, não é mesmo? Ou seja, só pode acessar quem o decifra. E isso é para poucos.

Fotos: (1) Reprodução; (2) Emater/RS.

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